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Especialista em... Sustentabilidade na construção de estradas

Alexandra Costa30/11/2025

A digitalização está a transformar a forma como gerimos as infraestruturas permitindo decisões mais informadas, eficientes e sustentáveis. Neste contexto, o BIM (Building Information Modeling) assume um papel central, ao integrar toda a informação de um projeto ao longo do seu ciclo de vida numa plataforma colaborativa única, que facilita a cooperação entre projetistas, empreiteiros e gestores de infraestruturas.

O desafio técnico é enorme: requer inovação, novas normas e critérios de contratação pública que integrem limiares máximos de emissões e valorizem materiais circulares e de baixo carbono. A redução da pegada de carbono de materiais como o betão e o aço é fundamental.
O grande desafio está em olhar para todas as fases do ciclo de vida. A fase de operação representa cerca de 80% das emissões totais associadas a uma estrada, o que eleva o desafio para além da infraestrutura física, exigindo uma transição energética e tecnológica no modo como nos movemos.

Patrícia Figueira

Diretora de Sustentabilidade e Inovação na IP, desde 2023, onde coordena iniciativas que promovem a transição sustentável e a inovação no setor das infraestruturas de transporte.

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Como é que a Infraestruturas de Portugal (IP) enquadra a sustentabilidade na sua estratégia global para o setor rodoviário?

A estratégia de sustentabilidade da IP integra os princípios ESG – Ambiente, Social e Governança – através de um conjunto de eixos estratégicos alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e aplicáveis a toda a atividade, incluindo o setor rodoviário.

Na dimensão ambiental, destacam-se a transição energética, a mitigação e adaptação às alterações climáticas, a economia circular e a proteção da biodiversidade. No pilar social, valorizam-se os colaboradores, a cadeia de valor, a mobilidade e a segurança dos utilizadores. Na governança, sobressaem a ética, a transparência, a inovação e a cibersegurança.

Esta estratégia concretiza-se no setor rodoviário através de políticas, planos de ação e instrumentos de gestão que visam equilibrar eficiência, segurança, resiliência, impacto ambiental e valor social. Por exemplo, na dimensão social, o Plano de Redução da Sinistralidade Rodoviária 2024-2030 visa diminuir acidentes e vítimas mortais, reforçando a sustentabilidade do serviço prestado. A sustentabilidade enquadra-se na estratégia, mas para nós é importante demonstrar a ação concreta.

Quais são as principais medidas já implementadas para reduzir o impacto ambiental na construção e manutenção de estradas?

A IP reconhece o seu papel na transição para um modelo de desenvolvimento mais sustentável, integrando preocupações ambientais ao longo do ciclo de vida dos projetos rodoviários.

Implementamos medidas para minimizar o impacto ambiental, promovendo a economia circular, a gestão eficiente de resíduos, a redução das emissões e ruído e a proteção da biodiversidade.

Para garantir que estas práticas são cumpridas, é exigido aos empreiteiros sistemas de gestão ambiental certificados e a implementação de sistemas de acompanhamento e monitorização ambiental em obra ajustados à sua complexidade. Por outro lado, todos os grandes projetos da IP são sujeitos a avaliações de impacto ambiental, que definem medidas obrigatórias de minimização e compensação.

Isto permite-nos avaliar continuamente o desempenho ambiental das intervenções, identificar melhorias e corrigir desvios. Há muito a fazer, muito está a ser feito, mas muito mais pode continuar a ser feito.

Que papel têm os materiais reciclados e as soluções de economia circular nas obras rodoviárias promovidas pela IP?

A empresa tem apostado numa estratégia para incrementar os princípios de circularidade de materiais abrangendo todo o ciclo de vida dos seus projetos, designadamente, nas suas empreitadas (obras), quer por via da adoção de métodos construtivos mais eficientes, quer pelas exigências relativas aos materiais utilizados e à gestão dos resíduos produzidos.

Nos cadernos de encargos, exigimos a elaboração de Planos de Prevenção e Gestão de Resíduos de Construção e Demolição (PPGRCD) e a utilização mínima de 10% de materiais reciclados ou com incorporação de reciclados, reduzindo o uso de matérias-primas virgens. A quantidade de material reciclado ou com incorporação de reciclado incluído nas empreitadas rodoviárias da IP, concluídas em 2024, foi de 15,4%. Esta percentagem tem vindo a crescer gradualmente, e com enquadramento técnico e regulatório adequado, sendo que queremos ver uma evolução exponencial.

Nas ações de conservação, promovemos a reutilização de materiais provenientes das próprias obras, como misturas betuminosas e elementos de betão, diminuindo o volume de resíduos enviados para vazadouro e a pegada carbónica associada ao transporte. A IP monitoriza ainda as emissões de gases com efeito de estufa associadas aos materiais e privilegia, sempre que possível, soluções de baixa intensidade carbónica e proximidade geográfica, contribuindo ativamente para a descarbonização da construção rodoviária.

De que forma as novas tecnologias - como o Building Information Modeling (BIM) e a digitalização - podem contribuir para uma gestão mais eficiente e sustentável das obras?

A digitalização está a transformar a forma como gerimos as infraestruturas permitindo decisões mais informadas, eficientes e sustentáveis. Neste contexto, o BIM assume um papel central, ao integrar toda a informação de um projeto ao longo do seu ciclo de vida numa plataforma colaborativa única, que facilita a cooperação entre projetistas, empreiteiros e gestores de infraestruturas.

Esta abordagem traduz-se em benefícios concretos: melhor visualização e coordenação do projeto, deteção precoce de conflitos, levantamentos de quantidades mais precisas, estimativas de custos mais rigorosas e análises do desempenho da infraestrutura antes da sua construção. O BIM simplifica e otimiza as fases de projeto, construção, operação e manutenção, promovendo maior eficiência, redução de erros e decisões mais sustentáveis.

Estas ferramentas estão também na base da transição para uma lógica de ‘infraestruturas inteligentes’ onde os dados recolhidos em tempo real, e ao longo da vida útil das estradas, alimentam modelos de gestão preditiva, permitindo intervenções mais rápidas, seguras e sustentáveis.

A IP iniciou já o processo de transição digital na área da conceção e gestão de empreendimentos, com a implementação progressiva da metodologia BIM. Neste contexto, foram recentemente adjudicados dois procedimentos que integram esta abordagem, marcando um passo relevante na consolidação de uma cultura digital nos projetos da empresa.

Não posso deixar de referir a importância de uma evolução rápida dos 'standards' de mercado para que a nossa ambição não cause dificuldades à concorrência no mercado.

Como é que a IP está a preparar as suas infraestruturas para os impactos das alterações climáticas e para fenómenos meteorológicos extremos?

As alterações climáticas estão a colocar novos desafios à gestão das infraestruturas de transporte, exigindo sistemas mais robustos, adaptáveis e preparados para resistir e recuperar face a eventos meteorológicos extremos. A resiliência passou a ser uma condição essencial - antes, durante e após cada evento - garantindo a continuidade dos serviços e a segurança dos utilizadores.

Perante esses desafios, a IP desenvolveu o Plano de Resiliência das Infraestruturas às Alterações Climáticas (PRIAC), que avalia os riscos climáticos atuais e futuros e a resiliência das suas três redes: rodoviária, ferroviária e de telecomunicações.

O PRIAC concretiza uma avaliação dos riscos climáticos (atuais e futuros) das infraestruturas geridas pela IP, identificando e planeando medidas e ações que garantam a resiliência às alterações climáticas, numa perspetiva de gestão adaptativa das infraestruturas, e ao longo do tempo, antecipando e minimizando potenciais riscos climáticos, e concorrendo, por esta via, para a segurança, fiabilidade, sustentabilidade e plena capacidade de gestão e exploração das infraestruturas geridas pela IP.

A natureza das medidas de adaptação implementadas ou planeadas é muito variada e depende da avaliação do risco das infraestruturas em termos dos perigos climáticos mais críticos.

Algumas medidas físicas são incorporadas logo em fase de projeto, designadamente, o dimensionamento de obras de arte especiais para cheias de período de retorno milenar e a estabilização, proteção e reperfilamento de taludes e encostas. Outras medidas surgem na fase de manutenção, como por exemplo, os contratos de manutenção/conservação corrente da rede rodoviária nacional, por distrito, que já requerem a implementação de medidas de adaptação, designadamente nas áreas mais vulneráveis aos perigos climáticos mais significativos.

Que importância tem a colaboração com o setor privado, universidades e centros de investigação na promoção de soluções mais sustentáveis?

A inovação aberta e a partilha de boas práticas é essencial. A IP tem vários exemplos de colaboração com o setor privado, universidades e centros de investigação no desenvolvimento de projetos de sustentabilidade e inovação.

A empreitada de melhoria das acessibilidades à zona industrial de Riachos (ER243), que foi um projeto do Plano de Recuperação e Resiliência, é um bom exemplo desta colaboração. Tratou-se de um projeto executado em parceria com a Pragosa e a Universidade do Minho, no qual se utilizou um método inovador que consistiu na Reciclagem a Frio de Pavimentos Flexíveis com Betume-Espuma, utilizando uma central móvel.

Esta solução conduziu à reutilização de todo o material fresado obtido na própria obra, reduzindo o consumo total de matérias-primas que seriam necessárias utilizar, reduzindo os materiais a depositar em vazadouro e as emissões de GEE associadas. Portanto, com menos transporte, sem necessidade de aquecimento e aproveitamento total do pavimento existente, esta solução provou ser mais ecológica, eficiente e alinhada com a economia circular e a descarbonização da construção.

Nos últimos 10 anos, a IP participou em mais de 40 projetos de inovação cofinanciados por programas europeus, na área da conetividade e telecomunicações, sensorização e monitorização das infraestruturas e da mobilidade, informação e gestão de tráfego, gestão de ativos, ambiente, resiliência e energia, segurança e cibersegurança.

Neste contexto a IP tem também o Programa dos 50 desafios de Inovação que constitui uma espécie de portefólio para o estabelecimento de parcerias, no qual se identificam as necessidades atuais e futuras na nossa atividade, nas quais a inovação pode ter um papel na implementação de soluções para suprir essas necessidades.

O futuro da construção rodoviária em Portugal pode passar por estradas neutras em carbono? Quão perto estamos dessa meta?

A neutralidade carbónica da construção rodoviária é um objetivo ambicioso, mas inevitável, que exige atuar em três frentes complementares:

  • Descarbonização dos materiais e processos construtivos, incluindo o transporte;
  • Eficiência energética e gestão inteligente das infraestruturas; 
  • Captura e compensação de carbono.

O desafio técnico é enorme: requer inovação, novas normas e critérios de contratação pública que integrem limiares máximos de emissões e valorizem materiais circulares e de baixo carbono. A redução da pegada de carbono de materiais como o betão e o aço é fundamental.

Paralelamente, a digitalização e sensorização das infraestruturas e respetiva geração de dados a par da utilização de soluções de inteligência artificial conduzem a uma gestão preditiva e mais eficiente da infraestrutura, prolongando o seu ciclo de vida e evitando intervenções desnecessárias - o que também se traduz na redução da pegada carbónica da infraestrutura.

O grande desafio está em olhar para todas as fases do ciclo de vida. A fase de operação representa cerca de 80% das emissões totais associadas a uma estrada, o que eleva o desafio para além da infraestrutura física, exigindo uma transição energética e tecnológica no modo como nos movemos.

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